A presença e os desafios das mulheres no mundo dos games

Foto por Andre Hunter.

Ser mulher não é tarefa fácil. Diariamente elas lidam com a misoginia, o assédio e a discriminação. Infelizmente, no mundo dos games não é diferente, afinal, o universo geek ainda é muito masculinizado e machista, sendo frequentemente hostil com as garotas. Mesmo que isso esteja mudando, o processo é lento e demanda muito esforço. Por outro lado, as mulheres dominam cada vez mais o mercado dos jogos eletrônicos, possibilitando mudanças essenciais em um cenário que ainda não vê o sexo feminino como participante.

Como parte desta mudança de paradigmas, as mulheres são a maioria que jogam videogames no Brasil. Segundo a Pesquisa Game Brasil 2019, 53% do público gamer no país são mulheres. Não é de surpreender, já que muitas garotas se mostram parte disso estando presentes em campeonatos de eSports, fazendo streams, blogs e canais no Youtube, além de sempre comentarem nas redes sociais. Essa presença traz cada vez mais meninas pra esse universo, que, na verdade, sempre foi delas.

Anna Clara Amorim e Carol Lilium são jogadoras assíduas e cosplayers, como também grandes exemplos da presença feminina no universo dos games. Lilium também tira seu tempo como streamer, fazendo lives jogando um pouco de tudo que curte. Seu primeiro contato com games foi enquanto assistia seu primo jogar Master System, depois não parou mais quando ganhou seu primeiro console, um Playstation 1. Já Anna foi introduzida a esse mundo quando ganhou um Polystation de Natal na infância. Isso prova que vídeo games não são “coisa de menino”.

“As mulheres sempre estiveram no mundo gamer”, diz Carol. “Hoje aparecem mais por conta das competições que podem levar ao mundial, como os campeonatos de LOL (League of Legends) e outros. E acredito que só tem a crescer o envolvimento feminino nesse âmbito. O importante é se divertir!”, completa.

Anna Clara Amorim e Carol Lilium, respectivamente.

“É inevitável encontrar pessoas que acham impressionante você estar ali. Ou mesmo se deparar com um questionário sobre seus conhecimentos para evitar que sua carteirinha de “menina diferente” não seja cassada.”, ironiza Anna Clara, dando ênfase no quanto as meninas costumam ser questionadas de suas capacidades e conhecimentos para que sejam vistas como gamers.

Quando perguntada se já sofreu algum tipo de agressão verbal ou discriminação por jogadores homens, Anna afirma que nunca passou por situação semelhante, já que não se envolve com esse último tipo “porque é cansativo e transforma uma questão de gosto em uma questão de gênero, coisa que meus amigos não fazem”. Contudo, a jovem conta as diversas vezes que soube ou presenciou “ofensas direcionadas ao gênero de alguém e não por qualquer outro fator”, como ela mesma atesta.

Além do mais, a cosplayer analisa o problema como algo histórico e estrutural da sociedade; um machismo cultural que requer muita desconstrução. Por conta disto, Anna acredita que um dos caminhos é a combate a hiperssexualização feminina nos vídeo games. “Algo que é importante e que aconteceu no jogo Final Fantasy VII é a diminuição da sexualização feminina nos jogos. O combate a estereótipos e clichês de gênero é essencial para acabarmos com as diferenças de tratamento entre homens e mulheres. É bom ver que a indústria dos jogos está se preocupando com isso.”, contou.

Carol Lilium jogando durante uma live em seu canal no Twitch.

Anna Clara, por outro lado, prega o quanto é importante também o fim da categorização “garota gamer”. Para ela, a categoria “coloca em dois grupos diferentes uma mulher e um homem, como se a experiência de cada um dentro do jogo fosse diferente. Fora os problemas enfrentados por nós mulheres, claro.”, explica. Para ela, deve-se naturalizar mais a presença feminina em convenções, eventos, partidas e empresas de jogos eletrônicos, ao invés de simplesmente dizer “isso é uma pessoa que curte games e isso é uma menina que curte games.”

Em tom de reafirmação, a exímia jogadora de Kirby finaliza garantindo que as mulheres vieram para ficar e que têm muito a oferecer dentro do universo dos games. “Eu estou aqui pra me divertir! Nós mulheres temos muito mais a mostrar do que apenas o nosso martírio enquanto minoria: nós temos jogos, consoles e trilhas sonoras favoritas. O importante também é lembrarmos que estamos lá por que queremos e por que gostamos de participar do meio gamer. Desse jeito, nossa presença será naturalizada aos poucos.”

A streamer Carol completa dizendo que “ser gamer traz muitos momentos ótimos e felizes. Como tudo na vida, há seu lado negativo: também é complicado, árduo e cansativo, mas só de ter a chance de divertir alguém, trazer um riso ou sorriso alheio compensa tudo, sabe?” Enquanto isso, a jogadora vê com muita positividade seu futuro no mundo dos games. “A perspectiva é crescer, de pouquinho em pouquinho, sem pressa. Porque pular degrau não te faz chegar ao fim da escada sem a chance de cair.”


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